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Especial

A importância de se falar sobre saúde mental dentro e fora do esports

A psicologia e a psiquiatria ainda são um tabu na sociedade

Aviso: O conteúdo desta matéria pode ser doloroso e sensível para algumas pessoas.

A saúde mental ainda é um tema sensível e muitas vezes evitado em conversas cotidianas. Falar sobre ela no contexto dos esportes eletrônicos é ainda mais complicado. Os jogadores muitas vezes enfrentam altas pressões, expectativas e frustrações. Além disso, a natureza online e anônima dos jogos pode levar ao cyberbullying, assédio e hate até mesmo no cenário de alto nível.

Nós, do VALORANT Zone, preparamos esta matéria especial para incentivar o diálogo aberto sobre o tema e, principalmente, informar sobre a importância dos psicólogos dentro e fora do universo de esportes eletrônicos. Conversamos com a psicóloga da FÚRIA, Airini Bruna Cucco, o médico psiquiatra formado pela Escola Paulista de Medicina (Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP), Bruno Maranhão, e também com o atleta profissional do time inclusivo da LOUD, “m4nd“.

O Setembro Amarelo

Durante todo o mês de setembro, acontece a campanha “Setembro Amarelo“. Uma ação que tem como objetivo promover a conscientização sobre a importância da prevenção do suicídio, que é uma questão de saúde pública em todo o mundo. Essa campanha foi criada em 2015 no Brasil pelo Centro de Valorização da Vida (CVV), Conselho Federal de Medicina (CFM) e pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).

A importância do movimento

Especializada em Psicologia do Esporte e da Atividade Física, Airini está na organização desde novembro de 2021. Sendo uma peça chave dentro da FÚRIA, a psicóloga explica qual a importância e o peso dessa data. “Ter um mês dedicado a uma pauta tão importante é extremamente necessário para que as pessoas entendam a gravidade que estamos vivendo hoje em dia. Ainda mais no Brasil, que está no ranking como um dos países que mais tem casos de ansiedade e depressão.”

O setembro amarelo, além de ressaltar a importância sobre a prevenção do suicídio também auxilia as pessoas a terem uma atitude mais empática e acolhedora com pessoas que sofrem desse transtorno. É um exercício de autorreflexão para que as pessoas se tornem mais conscientes e cuidadosas com as pessoas do convívio do dia a dia, porque nem sempre saberemos quem tem depressão ou ansiedade. Muitas vezes isso é mascarado.”

Airini Bruna Cucco – Reprodução/Twitter

O psiquiatra Bruno Maranhão diz que o movimento é uma oportunidade para conversar com a sociedade e ter um espaço na mídia para tratar de um tema que ainda sofre muito tabu. “É um assunto muito delicado e que, muitas vezes, é tratado de forma inadequada. O suicídio pode, infelizmente, ser uma opção para qualquer indivíduo, independentemente da classe social ou crença. Por isso, é muito importante falar sobre transtorno mental e saúde mental. Gostaria que pudéssemos discutir isso durante todo o ano.”

Quais são os fatores de risco e como podemos ajudar?

As mudanças no comportamento costumam ser o primeiro sinal perceptível de alguém que está considerando o suicídio. Airini diz que, normalmente, a pessoa começa a manifestar uma falta de interesse por atividades que antes desfrutava e acaba ficando grande parte do tempo mais isolada. “Além disso, também tendem a ter uma visão mais negativa sobre si mesmo e sobre a vida. E esses pensamentos vem acompanhados de frases como: “Não vejo sentido na vida”; “As coisas seriam melhores se eu não existisse”

A melhor forma de ajudar casos como esse é acolher, ouvir, não julgar e oferecer ajuda. Comentários do tipo “mas a vida é tão linda” ou “você precisa sair mais” são arriscados e podem fazer com que a pessoa acabe se isolando ainda mais. Caso você passe por uma situação como essa, é importante que a pessoa se sinta compreendida – afinal, todos nós já passamos por situações de desesperança e dificuldades que achávamos que não seriamos capaz de superar. Por isso é importante oferecer ajuda: se disponibilizar em indicar e até mesmo em acompanhar a pessoa em um psicólogo ou psiquiatra.”

“Temos que lembrar que o suicídio está associado praticamente à qualquer tipo de transtorno mental. Então, quando o indivíduo muda, precisamos entender se essa mudança está associada ou não à algum sofrimento, e aí sim, investigar e começar a realizar todo o tratamento e prevenção necessários.” completa o psiquiatra Bruno Maranhão.

Medidas de prevenção

De acordo com o psiquiatra Bruno, existem diversas medidas para prevenir o sofrimento mental e reduzir as taxas de suicídio. “Existem medidas públicas, como a restrição ao acesso a armas, por exemplo. Sabemos que países com maior acesso à elas, também apresentam um risco mais elevado de suicídio.”

Segundo o psiquiatra, também é crucial focar na redução da desigualdade social e na melhoria da educação. Ele enfatiza a importância de aprimorar os fatores que contribuem para um desenvolvimento mais saudável das pessoas. “É essencial aumentar o acesso aos serviços de saúde mental, garantindo um maior número de profissionais disponíveis para oferecer tratamento às pessoas que necessitam. Se conseguirmos abordar todas essas questões de maneira eficaz, sem dúvida alguma poderemos reduzir significativamente as taxas de suicídio.

Psicologia e Psiquiatria x Esports

Ainda pouco se fala sobre como os profissionais da saúde são de extrema importância para o esporte eletrônico. Apesar disso, com o aumento de todos os cenários e modalidades, a preocupação com os atletas tem crescido gradativamente. A psicóloga comenta sobre o momento em que a área da psicologia se tornou mais necessária nesse meio. “A psicologia sempre foi um aliado muito importante dos esports. No primeiro momento estava muito mais relacionado a melhora de performance. Mas com o passar dos anos e com o crescimento de todo o cenário, percebo que hoje há uma preocupação muito maior em relação a formação do atleta e ser humano como um todo. Até mesmo por conta dos diversos casos que já vimos em relação a suicídio dentro de algumas modalidades.”

Para Bruno, ainda existe muito estigma sobre os psiquiatras e sobre a saúde mental. “O psiquiatra ainda é visto como “médico de doido” é como se fôssemos a última exceção. Na verdade, o psiquiatra é um médico que é especialista em saúde mental e sofrimento humano e por isso, têm diversos recursos para amenizar ou até mesmo tratar aquele sofrimento.”

Ambiente competitivo

Para um jogador profissional, é normal que em muitos momentos haja dúvidas sobre a própria carreira. Frustração, hate, falta de confiança e outras questões podem ser cruciais para o psicológico do atleta. Para “m4nd”, lidar com essas dificuldades é, de fato, complicado, mas ter o auxílio de um psicólogo é crucial no dia-a-dia.

m4nd
Bruno Alvares/Riot Games

Lidar com as frustrações é um pouco complicado, porque muitas vezes você não sabe como se expressar da forma correta ou o que você está sentindo. Então, normalmente, para lidar com as minhas frustrações eu tento fazer algumas técnicas de respiração ou de autoconhecimento, e também converso muito com o psicólogo do time que a gente tem, que está lá para apoiar a gente todo dia. Temos sessões individuais e em grupo, que nos ajudam bastante a conseguir lidar com as frustrações e meio que tomar as rédeas do que está acontecendo no nosso dia a dia.”

Airini completa: “O ambiente competitivo gera muita pressão, ansiedade, frustração. Além disso, geralmente os atletas tem que abdicar da própria vida para morar em outro estado ou em outro país, deixando família, namorado(a) e amigos de lado. Também não podemos esquecer da parte de que os jogadores tem que lidar com críticas constantes das redes sociais, independente se ganham ou perdem um jogo – e acho importante ressaltar que a maior parte da comunidade esquece que atrás daquele atleta, existe um ser humano com sentimentos. Caso o jogador não tenha um espaço de desenvolvimento, acolhimento e acompanhamento adequado, todas esses fatores que existem dentro do ambiente competitivo podem fazer com que ele desenvolva transtornos de ansiedade ou depressão em diversos níveis.

Importância do psicólogo dentro de uma equipe

É encorajador ver que algumas grandes organizações de esportes eletrônicos, como a LOUD, FÚRIA, W7M, MIBR e outras, estão reconhecendo a importância da saúde mental dos atletas e estão investindo em profissionais da área, especialmente psicólogos. Isso representa um passo significativo na direção certa para garantir que os jogadores tenham acesso ao apoio necessário para lidar com os desafios mentais associados à competição.

De acordo com m4nd, ter um profissional que acompanha diariamente a vida do atleta é importante para que o próprio jogador tenha liberdade de se entender completamente. “Ter ele lá é muito importante por isso, pra você ter a liberdade de conversar sobre o time e também conversar um pouco sobre o pessoal, dando uma mesclada pra você se entender também. Além disso, quando você conversa com um profissional desses, você se sente uma pessoa mais ativa e mais animada, porque acaba conseguindo entender melhor os seus sentimentos. O psicólogo é muito importante porque ele te dá outra visão de algo que você está muito focado e que, às vezes, acaba não percebendo que tem outros caminhos.”

Em relação as insatisfações e ao hate que o atleta recebe, a psicóloga Airini comenta: “Dentro do ambiente terapêutico o psicólogo auxilia o atleta a compreender melhor as suas insatisfações, e também a compreender o que está sobre o domínio dele. Por exemplo, comentários negativos que ele recebe. Não está sob o controle dele, mas ele tem o poder de escolha de como vai lidar com aquela situação.”

A vida fora dos jogos

M4nd comenta que já teve contato com terapia durante um tempo de sua vida e também diz que é normal se sentir frustrado e desmotivado nessa profissão, mas o mais importante é não desistir.

Por um tempo na minha vida, eu sofri com alguns problemas e a terapia me ajudou bastante. Meio que foi um trabalho contínuo. Eu já saí de uma pra outra, e o trabalho com a terapia no time faz muita diferença, de verdade.

O atleta diz que a frustração é normal, mas importante para o aprendizado: “Se sentir frustrado e desmotivado é normal, por incrível que pareça. É uma profissão de alto desempenho, então você está lá tentando dar o seu máximo, enquanto outras pessoas também estão dando o máximo delas. Mas, nem sempre você será a pessoa que ganha, né? Afinal, só um time é vencedor. O que eu digo é: não desista e saiba que, se o caminho for fácil demais, pode ser que você esteja pelo caminho errado. Não é fácil, é uma profissão bem elitizada e terão as suas dificuldades, só que elas vão te ensinar muitas coisas. E é muito importante que você aprenda com essas dificuldades. Não deixe só elas passarem. Aprenda.


Caso você ou alguém que você conheça esteja em situação de risco, não hesite em procurar o auxílio de um profissional de saúde mental ou entrar em contato com um serviço de prevenção ao suicídio.

Centro de Valorização da Vida (CVV) – 188

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